terça-feira, 12 de agosto de 2014

Off-Topic (15)

Das imagens que o brasileiro tem de si mesmo - e não faz nenhuma questão de negar -, uma das mais clássicas é a da "memória curta". Esse argumento é usado, especialmente, para falar dos políticos: "não se lembra em quem votou" ou "reelegeu esse cara, que fez isso e aquilo".

Outra imagem que vem sendo resgatada e bastante difundida é a da "síndrome de vira-lata", usada para descrever a ideia de que o "nosso não presta" e o que é de fora é "sempre bom".

Essas duas imagens se uniram na ocasião da morte do ator Robin Williams (segunda-feira, 11).

Robin Williams foi um grande ator, seja em comédias ou em dramas: protagonizou filmes históricos, indo de "Sociedade dos poetas mortos" a "Uma babá quase perfeita", passando por "Amor além da vida", "Bom dia, Vietnã", "Homem Bicentenário" e "Férias no trailer".

Logo que anunciado o falecimento do artista, as redes sociais se tornaram palco de lamentos profundos, e milhões de "fãs" brasileiros surgiram.

5 anos atrás, porém, o que Robin Williams mais tinha no Brasil era uma legião de odiadores, pessoas que sugeriam boicote a seus filmes, falando que na verdade ele era um ator medíocre, e muitos ainda fizeram referência aos problemas de dependência química que o atinigiram - como foi o caso da maldosa e tendenciosa edição do Bom Dia, Brasil.

O motivo: Robin Williams fez uma piada de mau gosto sobre a escolha do Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos de 2016 (Chicago foi a concorrente finalista nessa disputa).

Relembre:


Se bem observado, o comentário de Robin Williams, na verdade, ofende MUITO MAIS os membros do Comitê Olímpico Internacional (ora, quem se vende por shows de striptease e cocaína é o quê?!).

Um ano depois, quando divulgava o filme "Surpresa em Dobro", o ator deu uma entrevista para um canal brasileiro, e fez mais algumas anedotas sobre o povo e os costumes locais:


Sem problemas, ninguém mais lembra. Robin Williams agora é muito querido e amado pelos brasileiros. Todos os problemas que teve - e, em último caso, causaram sua morte - já estão esquecidos, em nome de sua grande obra. A semana na TV aberta promete várias reprises e lembranças de filmes estrelados pelo ator. E seus comentários sobre o Brasil, na verdade, já entraram para uma galeria infinda de estrangeiros (famosos) que "falaram mal" do país.

Já se tornou clássico o caso do astro do UFC Chael Sonnen (que já mais de uma vez caiu em exames antidopping): visando promover sua(s) luta(s) com Anderson Silva, Sonnen destilou veneno não apenas contra o rival mas também contra outros lutadores da nacionalidade de Silva e também sobre o Brasil. "Aqui, a dança das Paraolimpíadas se chama capoeira e cocaína se chama brunch [lanche]", disse o americano.

Ao saber da polêmica que a frase causou (nova legião de odiadores e afins), o lutador "retratou-se" dizendo: "Se eu tivesse a mais remota ideia de que existem computadores no Brasil, não teria feito isso". Em outra oportunidade, Sonnen afirmou que "[no Brasil] se você baixar a cabeça, te roubam a carteira".

Então, depois de tudo isso, o que acontece? Isso mesmo! Sonnen é convidado a ser uma das estrelas principais do "TUF", reality show de MMA filmado no Brasil e transmitido pela Rede Globo. Não bastasse, ainda dá uma entrevista super polida e é coberto de elogios pela "primeira dama da TV Nacional", Angélica.

Ídolos brasileiros: Wanderley Silva, Isabel, Hortência e Chael Sonnen
O que há em comum entre Robin Williams e Chael Sonnen, além de serem famosos? São dos EUA.

Em 2010, em entrevista sobre o filme "Mercenários" (produzido no Brasil), Sylvester Stallone declarou: "Lá você pode explodir tudo, que as pessoas te agradecem e ainda te dão um macaco de presente".

Em resumo: se você for famoso e estrangeiro, está autorizado a falar mal do Brasil, dos brasileiros, do que for. A revolta vai durar uns dois dias e meio, irá gerar pequenos surtos patrióticos, mas depois tudo volta ao normal. E você ainda será adulado pelos mesmos que te apedrejavam.

A menos que você seja argentino, meu camarada!

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Recordar é viver:


1) Jornalista argentina comenta episódio de "Os Simpsons" no Brasil
2) Revista Veja comenta relação de Diego Maradona com o Brasil

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